giovedì, gennaio 12, 2006

Typically Men

(uma história de amor, abuso, divórcio, estrelas e esperança, com muita tecnologia à mistura)

Peça em 1 acto.

Personagens:
Sol
Maria

Background:
Cenário dividido ao meio. À esquerda um sol pálido e uma imagem do Big Ben, à direita um sol forte e uma imagem de uma baía com palmeiras.

Abre cortina. Maria já está sentada no banco da esquerda, lendo um livro. Sol entra, tira o casaco Bad boy, pendura na cadeira da direita. Por baixo tem uma t-shirt com a fotografia de Bob Marley, com os dizeres ‘Sun is shining...’ Senta-se na cadeira, cruza as pernas. Na mão traz um celular com que vai brincando. Pisca o olho a Maria.

Maria (levanta os olhos do livro):
Ayo, Silver!

Sol:
How u? (‘How are you’ com sotaque sul africano)

Maria:
Ok (olha para a t-shit de Sol com atenção) O sun também esta shining ali fora.

Sol:
Good. Hoje pedi ajuda divina para acabar com o cinzento da minha vida e desta cidade. Parece que me ouviram. À tarde o sun tava shining

Maria (sorri):
Eu também peco sol todos os dias.

Sol (baixa os olhos envergonhada):
Ok... É verdade também ontem à noite falei com ele. (Espera a medo a reacção de Maria) Ok, ok podes bater.

Maria (calmamente):
Falaste com qual deles?

Sol:
Como qual deles? Quantos é que eu tenho neste momento? Eu sei, todos eles merecem que eu leve porrada.

Maria:
O irmão ou o original?

Sol:
Ah. O original. Com o irmão falo normalmente todos os dias. O que estava desaparecido era o original

Maria:
Ah, sim.
Sol (examinando as unhas):
Bem... ele ligou primeiro. Pelo menos isso, não?

Maria:
Sim, sim. E que disse ele?


Sol:
Queria ir à minha casa, suponho que para devolver as chaves que eu lhe pedi de volta. Eram nove da noite. Eu disse que não estava em casa. Ele disse para ligar quando chegasse a casa.

Apaga luz do lado do cenário de Maria, foco em Sol. Sol pega no celular e escuta.

Voz off:
Não precisas de ter pressa

Sol:
Podes passar onde eu estou.

Voz off:
Não, não, liga quando chegares a casa.

Reacende luz do cenário de Maria, sai foco de Sol.

Sol:
Depois mandou uma mensagem a dizer que estava muito cansado e que ficava para hoje. Quando cheguei a casa liguei e ficámos a bater um papo

Maria:
E daí o sol?

Sol (envergonhada):
Bem... sim. O papo não foi positivo, mas também não foi negativo. Continuo sem saber o outcome final. Mas pelo menos já não tenho aquela sensação de abandono.

Maria:
Mas também não foi neutro?!

Sol:
Mais para o sim que para o não. (Pausa) Eu perguntei o que é que eu tinha feito, e porque é que ele tinha desaparecido. Ele disse que desapareceu para não me incomodar; porque eu estava de férias.

Maria:
humn?

Sol:
Sim. Então eu perguntei porque é que ele achava que me estaria a incomodar. Ele acabou por confessar que no fim do ano ele mandou uma mensagem e eu levei muito tempo a responder. Então eu disse, afinal sempre te chateei. E ele não disse nada. (Pausa) Eu disse que ele tem a mania de não prestar atenção ao que eu lhe digo. Eu expliquei nesse dia que não respondi logo porque não tinha rede. Mas aparentemente não deixou de o irritar. (Pausa) Claro que eu acho que essa não foi a única razão dele. Mas...

Maria:
Que ego, meu Deus.

Sol:
Por agora serve para saber, ao menos uma das coisas que o chateou. O meu primo é da opinião que ele estava era a fazer jogo para ver se eu dava o braço a torcer.

Maria:
Também me parece jogo.

Sol:
Como eu odeio essas porcarias. em particular porque eu não tenho tempo para estas merdas. Enfim... Mas nada de reclamar. The sun is shining.

Maria sorri.

Sol:
E toi?

Maria:
Estou in denial… Mas pronto.

Sol:
Details…

Maria:
O PhD, esta cidade, etc. Mas o sol brilha hoje. Até às 4 da tarde apenas, mas é o que se tem.

Sol:
Quais são os teus planos imediatos, neste momento, para atacar o teu pânico e denial?

Maria:
Dormir muito. Ando a hibernar

Sol:
Isso pode ser também sintoma de inverno

Maria:
Também não ajuda, a falta de luz. mas desde ontem que ha um solzinho. fico logo um bocadinho mais para cima. Isto não me acontecia em Lisboa.

Sol:
Pois. O sol é mais importante no Norte. Mas eu agora também o respeito muito aqui no Sul.

Maria ri.


Sol:
Quando é que acabas tudo? Vais defender?

Maria:
Não sei. Essa é ‘the million dollar question’.

Sol:
O ano de 2006 é propício para os tigres. É o ano do cão. começa a 29 de Janeiro.

Maria:
Cão e bom para nós?

Sol:
É muito bom. Cão e cavalo.

Maria:
Então a partir de 29 de Janeiro estou safa. cool

Sol:
Não sentes o vibe? Eu sinto desde o ano passado

Maria:
Ainda não, mas o cão ainda não chegou.

Riem as duas.

Maria:
Escuta isto. Na RTP memória no 30 minutos com... X diz: ainda ontem ouvi a não sei quê Horta e não sei quê a dizer, em 1984, porque é que era feminista e a atacar as duas violências dos homens. Os que batem e violentam psicologicamente. (Violência a) E os que se vitimizam dizendo que as amam e que não podem viver sem elas (Violência b). E ela diz que é a estratégia dos homens para prender as mulheres em casa. (Pausa) Achei curioso.

Sol:
Pois. concordo que é estratégia. É o que fazem por aqui... Os dois tipos de violência. Conheço as duas

Maria triste.

Sol:
Estás triste porque?

Maria:
Pelos dois tipos de violência.

Sol:
Oh... não há nada a fazer. É só saber fugir do ciclo, se ele começa.

Maria:
Lá está.

Sol:
O que?

Maria:
Fugir do ciclo se ele começa.

Sol:
Sim... o que é que tem?

Maria:
'Lá está', 'exacto'. São expressões.

Sol:
Sim... que significam algo...

Maria:
Para reforçarem o que foi dito.

Sol:
Não percebi exacto em que sentido. Reforçar que não se deveria ter que fugir?!

Maria:
Pois não.

Sol:
Pois... a esperança é que não comece. Às vezes não começa. Mas muitas vezes começa

Maria:
Como?

Sol:
Como começa?

Maria:
Não percebi a partir da esperança...

Sol:
A esperança que temos que ter é que a violência não comece. Nenhuma delas... Porque às vezes nunca começa.

Maria:
Claro

Sol:
Creio que existem algumas (ainda que poucas) relações saudáveis.

Maria:
Não digo que todos os homens sejam assim… ou todas as mulheres assado.. (Pausa) Sim, ja percebi a esperanca. (Sorri)

Sol:
Eu descobri que o meu pai é um abusador como os outros. o que significa que tecnicamente eu tenho como referência masculina o abuso.

Maria:
Bom, o teu pai não e o único macho que conheces. Viveste muitos anos com o teu pai?

Sol:
Os da adolescência todos.

Maria:
A infância foi com a tua mãe, não foi?

Sol:
Yep... traumatizada pelos abusos do meu pai.

Maria:
Pois... o meu pai também não e boa referencia.

Sol:
Bem... eu acho que fujo a sete pés de homens como o meu pai, mas ao mesmo tempo sou atraída por eles. Seduzem-me com falas mansas.

Maria:
Homens como o meu pai dão-me pena e não me atraem.

Sol:
Se calhar viveste longe dele muito tempo. Desenvolveste alergia.

Maria:
Via-o todas as semanas e nas férias estava com ele.

Sol:
Ah... eu também, com o meu. Mas não é a mesma coisa. A minha mãe tem um amor-ódio pelo meu pai, então manteve o meu fascínio.

Maria:
A minha mãe e o meu pai ficaram amigos. Mas acho que desde sempre pus na minha cabeça que não queria ter a vida dos meus pais.

Sol:
Se a minha mãe fosse amiga do meu, acho que eu não teria tanto fascínio por ele. Porque eu e ela nos daríamos melhor. Até agora eu consegui não encontrar tipos exactamente como o meu pai, mas todos eles têm tido um determinado grau de abuso para comigo. E agora vejo que é uma forma de reprodução da minha relação com o meu pai. Um medo terrível de perder.

Maria:
Concordo. Concordo com o abuso. Quer dizer, discordo, obviamente.

Sol:
Entendi, não te preocupes. Eu sei perfeitamente que as minhas escolhas são um desastre.

Maria:
Mas sabes que o Freud estava muito errado?

Sol:
Sei. Sei que eu é tenho um problema.

Maria:
Haja esperança!

Sol:
Não é que eu queira casar com o meu pai.

Maria ri.

Sol:
Ou que quero um companheiro como ele. Longe de mim. O problema é que é uma referência irresistível. (Pausa) Neste momento estou a divorciar-me do meu pai. Estou a dar um basta inclusive nos abusos dele para comigo. Quem sabe eu quebro o ciclo.

Maria:
Muy bien!

Sol:
Tenho que perder o medo de perder

Maria:
Exacto, perder o medo de perder. Também tenho disso.

Sol:
Já não vou a casa dele. Não lhe ligo e quero que ele me deixe em paz.

Maria:
E ele liga-te?

Sol:
Liga. Não suporta ser abandonado. Implora que eu vá à casa dele...

Maria:
Olha o gémeo do meu...

Sol:
Eu disse para comigo que para eu manter a sanidade tenho que estar longe. Já me bastam os meus abusos e demências, não tenho que aturar os dos outros.

Maria:
É muita carga
Sol:
Então estou à margem. (Pausa) Ele agora diz que eu lhe estou a mover guerra. Faz-se de vítima... Tadinho

Maria:
Típico

Sol (zangada):
Quero lá saber! Ele que se cure e me venha visitar. Já me subiu 30 anos, algum dia tinha que parar, né?

Maria:
Uma pessoa tem de se defender, caramba!

Sol:
Exacto!

Sol:
Acho que este diálogo daria uma boa peça de teatro

Maria ri.

Sol:
Typically men... (Pausa) é um bom titulo.



Maputo/Cambridge

12.01.06

mercoledì, gennaio 11, 2006

Be affraid

Be very affraid. I'm fascinating, but scary.